terça-feira, 10 de dezembro de 2024

Marx: nos caminhos da crítica à economia política

dezembro 10, 2024




Em 1844, sob a direção de Marx e Ruge saem, em Paris, os Anais franco-alemães. Entre outros textos, contêm o Esboço para uma crítica da economia política, de Engels, e o ensaio de Marx, Crítica da filosofia do direito - Introdução. Graças ao artigo de Engels, Marx percebeu a importância da economia política para compreender o capitalismo. Entre abril e junho do mesmo ano Marx realiza um primeiro encontro crítico com a economia política nos chamados Cadernos de Paris e nos Manuscritos econômico-filosóficos de 1844.

 

Em 1845, fevereiro, Marx estabeleceu um contrato de um livro intitulado Crítica da política e da economia política, que não chegou a redigir. Marx faz um ajuste de contas com sua concepção anterior e escreve as Teses sobre Feuerbach e, entre 1845-1846, junto com Engels, produz a Ideologia alemã.

 

Em 1847, Marx publica em francês Miséria da filosofia, em resposta ao livro do anarquista Proudhon, Sistema de contradições econômicas ou filosofia da miséria (1846). Depois dita uma série de conferências, conhecidas posteriormente (1849) com o título de Trabalho assalariado e capital.

 

Em 1848, fevereiro Marx publica um folheto intitulado Discurso sobre o problema do livre câmbio e, também, O manifesto do partido comunista, escrito com Engels entre dezembro de 1847 e janeiro de 1848, solicitado da Liga dos Comunistas.

 

Em 1851, retoma, em julho, a preparação de seu projeto de crítica à economia política. Entre novembro e dezembro troca opiniões com Engels, em Manchester, sobre o plano geral da obra: Livro I (crítica da economia política), Livro II (socialismo) e Livro III (história da teoria econômica).

 

Em 1853, Engels, em março, recomenda a Marx a concluir a crítica à economia político. Marx dedica-se aos seus cadernos de apontamentos, iniciados em 1851. No entanto, pressionado pela miséria, abandona sua obra por quatro anos.

 

Em 1857-58, Marx retoma a redação de sua crítica à economia política, apoiando-se em suas notas de 1850-53.  Desde outubro de 1857 até maio de 1858, redigiu um rascunho mais amplo do que seria O capital, que foi publicado, pela primeira vez em alemão pelo Instituto de Marxismo-leninismo de Moscou, em 1939, com o nome de Elementos fundamentais para a crítica da economia política 1857-1858 (“Gründrisse”/rascunho).

 

Em 1859, Marx termina a redação da Para a crítica da economia política, escrita entre agosto de 1858 e janeiro 1859, enviando em 25 de janeiro ao editor. Em junho é publicado.

 

Em 1860-61, Marx interrompe a continuação de sua obra econômica.

 

Em 1862-63, retoma novamente a redação de sua obra, sendo desse período seu trabalho Teorias sobre o mais-valor, pensado como tomo IV de O capital, que será publicada apenas em 1910 por Kautsky.

 

Em 1864-1883, do verão de 1863 até o verão de 1865, se sabe por Engels que Marx esteve redigindo os manuscritos dos Livros II e III de O capital. Marx ainda redige, em 1880, Glosas marginais ao tratado de economia política de Adolfo Wagner. Engels, após a morte de Marx (1883) usa seus manuscritos para elaboração e publicação. Marx, nos fins de maio a junho de 1865 prepara um escrito no qual procura adiantar algumas teses de O capital. Esse texto é lido nos dias 20 e 27 de junho de 1865 nas sessões do Conselho Geral da Associação Internacional dos Trabalhadores, e é publicado pela primeira vez sob o título de Salário, preço e lucro, em 1898. Em 1867 é publicado o Livro I de O capital – processo de produção do capital.  Em 1872, aparece uma segunda edição alemã com correções sobre a versão original. Engels ainda publica mais duas edições em alemão do Livro I: a terceira (1883) e a quarta (1890), além da edição inglesa (1887). Mas, não só isso, baseado nos materiais deixado por Marx, Engels publica o Livro II de O capital -o processo de circulação do capital (1885) e o Livro III de O capital – o processo global da produção capitalista (1894). Por fim, Kautsky publica o Livro IV de O capital – Teorias do mais-valor (1910).


Frederico Costa, professor da UECE


*Exemplar da primeira edição de O Capital, de Marx, no museu Deutsches Historisches, em Berlim, na Alemanha – Foto: Wikimedia Commons


domingo, 17 de novembro de 2024

O lugar da Proclamação da República na História

novembro 17, 2024

“Proclamação da República”, 1893, óleo sobre tela de Benedito Calixto (1853-1927)

A República no Brasil não se reduz ao seu ato inaugural: o golpe militar de 15 de novembro de 1889. O episódio foi resultado de conflitos de um conjunto de forças político-sociais que responderam às exigências de mudanças estruturais da formação social brasileira e da luta de classes.

No dia 3 de dezembro de 1870, assinado por cinquenta e oito pessoas, entre elas Aristides Lobo, Saldanha Marinho, Ferreira Viana e Quintino Bocaiúva, apareceu o primeiro manifesto republicano no jornal "A República". Dois anos depois, o primeiro recenseamento oficial registrou uma população de 8.419.672 de seres humanos livres e 1.510.860 de trabalhadores escravizados. E, duas décadas depois, ocorreu a Abolição da Escravidão, a destruição do Estado monárquico escravista e a estruturação do Estado burguês brasileiro.

O modo de produção escravista colonial hegemônico, com mais de trezentos anos de existência, era garantido pela superestrutura jurídico-política do Estado monárquico brasileiro, que se encontrava em crise permanente e crescente desde a segunda metade do século XIX. A destruição das relações de produção escravistas, nesse sentido, era inseparável da substituição do Estado imperial brasileiro.

Por isso, é importante situar o 15 de novembro, como faz Saes (2023), num processo específico de transformação política: a revolução antiescravista e antimonárquica que se desenrolou, fundamentalmente entre 1888 e 1891, por meio dos momentos sucessivos da Abolição da Escravatura (1888), da Proclamação da República (1889) e da Assembleia Constituinte (1891). Esses episódios, muitas vezes vistos de forma isolada, representam elos de uma corrente histórica de superação do Estado escravista moderno, fundado na primazia do ser humano livre sobre o trabalhador escravizado, por um Estado burguês baseado na concessão formal de cidadania a todos os indivíduos (Estado republicano).

Em 1888, por uma pressão de massas ruiu as relações escravistas de produção, minando a base estrutural do Estado imperial. Era a distinção entre ser humano livre e ser humano escravizado que coordenava e organizava todas as instituições políticas monárquicas brasileiras (Executivo, Poder Moderador, Senado, burocracia, Guarda Nacional, estrutura judiciária, por exemplo). A Proclamação da República, independente da forma que adotou,  completou a obra destruidora da revolução abolicionista (que destruiu o escravismo), quebrando não só o regime monárquico como todas as instituições políticas sustentadas pelas relações escravistas. Tal processo foi consumado pela Assembleia Constituinte que estabeleceu novas instituições políticas formalmente universais que conformaram um novo Estado de classe, não mais escravocrata, mas burguês.

É óbvio que o Estado e o regime republicano não foram resultados de um processo democrático de massas que levantasse a necessidade de reivindicações democráticas em torno dos direitos dos trabalhadores que foram escravizados, de reforma agrária, de direitos sociais (saúde, educação, regime de trabalho), de igualdade jurídica das mulheres, de independência nacional real, de reconhecimento das populações indígenas de sua autonomia e de soberania popular. O Estado burguês nasceu como uma república oligárquica, expressando as contradições do desenvolvimento desigual e combinado da formação econômico-social brasileira.

Hoje, nesses 135 de República brasileira, com o devido distanciamento histórico, pode-se afirmar que o 15 de novembro expressou um movimento progressivo diante do Estado monárquico escravista.

Hoje, a luta é outra. É pela instauração da República dos trabalhadores e das trabalhadoras no Brasil com base na superação das relações capitalistas de produção.


Referências

SAES, Décio. República do capital: capitalismo e processo político no Brasil. São Paulo: Boitempo, 2023.



Frederico Costa, Professor da UECE

domingo, 10 de novembro de 2024

Bloco de Notas: estrutura social alienada e processo de aprendizagem emancipador

novembro 10, 2024



A afirmação de que o ser condiciona a consciência é uma das coordenadas fundamentais do materialismo histórico. Isso significa que a consciência é produto das relações sociais predominantes, que são históricas e contraditórias. A consciência é produto do ser social e, simultaneamente, é produtora da sociedade em seu processo de reprodução de relações sociais e instituições, pois os indivíduos são seres conscientemente ativos.


As relações de produção capitalistas estabelecem formas de existência, de subjetividade, de sensibilidade e de posturas sociais dos indivíduos, que são reificadas (coisificadas) sob a forma de ter, de consumir e de se apropriar como propriedade privada. Assim, determinando maneiras de pensar, de agir e de sentir alienadas e fetichizadas.


Essa totalidade influi, no contexto da educação, no processo de aprendizagem. 


Sob a pressão das relações sociais capitalistas, por exemplo, discentes assistirão a uma aula, ouvindo palavras e buscando compreender seus significados e estrutura lógica da melhor maneira possível. Inclusive produzindo anotações para melhor memorizar o conteúdo e, assim, tirar boas notas nas avaliações. 


O interessante, nessa postura é que o conteúdo se torna estranho ao sujeito do processo de aprendizagem porque não se converte em um momento do sistema subjetivo de ideias do discente, enriquecendo-o e ampliando-o na sua prática de intervenção no mundo. Pelo contrário, conceitos e palavras se tornam núcleos fixos e congelados, ou seja, tornam-se coisas armazenadas em teorias abstratas sem contato com a vida social e histórica.

 

Estudantes e conteúdos ministrados nas aulas e atividades pedagógicas apresentam-se estranhos (alheios) uns aos outros. Dessa maneira, cada discente se constitui como proprietário de uma coisa (objeto cultural) produzido por alguém (estranho). Então, nesse modo de aprendizagem, estudantes não precisam criar ou produzir algo novo como síntese do conteúdo apreendido e suas necessidades sociais, favorecendo estruturas de poder dominantes que não estimula novas ideias e novos pensamentos sobre determinados assuntos. Do ponto de vista dos estudantes, sua subjetividade é condicionada, pela ideologia dominante, a temer mudanças e questionamentos ao acervo fixo adquirido.


À situação exposta acima há uma alternativa. Noutras palavras, há uma postura emancipadora de aprendizagem. Nela, discentes não frequentam as aulas como seres sem história, sem saber. Anteriormente, como indivíduos em processo de construção de autonomia, necessitam pensar os problemas e questões próprias. Nesse sentido, eles não são simples receptáculos vazios. 


A aprendizagem emancipadora exige que os discentes não sejam passivos. Não basta ouvir ou prestar atenção. É preciso uma relação dialética de apropriação e reação ativa ao conteúdo de maneira produtiva, pois esse processo estimula o pensar crítico de alunos e alunas. Geram-se novas ideias, novas questões, novas respostas e novas perspectivas na subjetividade dos sujeitos do processo de aprendizagem. 


Nesse movimento, até a atenção necessária é algo vivo. Há interesse. Estudantes ouvem e anotam numa atitude espontânea de vinculação com sua ação na vida social. Na aprendizagem emancipadora (não alienada), quando discentes se apropriam de um conhecimento produzido historicamente, eles e elas se transformam e se desenvolvem como seres autônomos e críticos para intervir socialmente, inclusive no próprio processo de ensino-aprendizagem. 


 Frederico Costa, Professor da UECE


Foto: Getty Images

domingo, 3 de novembro de 2024

Estudar “O capital” de Marx para quê?

novembro 03, 2024




Vamos iniciar um grupo de estudos de “O capital”. O que buscamos com essa atividade? Não somos os primeiros nem seremos os últimos a mergulhar na crítica mais fundamentada e radical do capitalismo.

 

Aqui pretendo apresentar alguns elementos norteadores para nosso estudo coletivo. Sem adiantar ou suprimir previamente a leitura e as reflexões necessárias sobre o texto que iremos realizar. Apenas procurarei indicar algumas coordenadas reconhecidas e aceitas por inúmeros estudiosos que já se debruçaram sobre essa obra seminal. Nesse sentido, eis algumas questões que buscaremos identificar a partir de nosso estudo:


1 – a estrutura do modo de produção capitalista e suas características universais como forma de entender o capitalismo contemporâneo e a situação de países periféricos como o Brasil;

2 – a diferença fundamental entre processos sociais aparentes e processos sociais essenciais, no geral e na sociedade brasileira em particular;

3 – a forma como no modo de produção capitalista se realizam os processos sociais e históricos de produção e reprodução da vida real;

4 – os fenômenos da exploração e da luta de classes imanentes ao modo de produção capitalista;

5 – o caráter próprio das relações sociais e ideológicas (culturais) na dinâmica do modo de produção capitalista;

6 – por último, os caminhos críticos e revolucionários que a crítica da economia política, realizada por Marx, vão abrindo no sentido de produzir uma compreensão da realidade no processo de transformação dela mesma.


Em nossos encontros, procuraremos desenvolver de maneira coordenada as seguintes posturas metodológicas: a) apresentar a temática referente ao livro, volume, seção e capítulo estudados para orientar os leitores; b) seleção ordenada de textos de apoio quando for necessário; c) dinâmica pedagógica para o trabalho coletivo de leitura, estudo e interpretação dos textos;  d) dimensionamento do tema principal tratados pelos textos lidos; e) levantamento de conceitos básicos; f) conexões possíveis dos temas básicos com outros momentos da obra de Marx; g) apresentação de problemáticas da realidade de países periféricos e do Brasil, em particular, refletindo sobre suas contradições estruturais, econômicas, políticas e ideológicas.


Essa proposta é uma dentre várias que serão desenvolvidas pelo caminhar de nossas reflexões.



Frederico Costa, Professor da UECE

 

 

 

sábado, 2 de novembro de 2024

BLOCO DE NOTAS: relação entre história e educação

novembro 02, 2024

Foto: radio.ufpa.br

 Frederico Costa, Professor da UECE


Nos estudos sobre educação, em particular no curso de pedagogia, uma pergunta se põe e impõe: qual a natureza da História da Educação?

Penso que o primeiro passo é analisarmos abstratamente (de forma separada) o que seria história e o que seria educação. Nessa ação analítica, temos como referencial teórico a dialética materialista, que procura compreender o mundo em sua totalidade como um conjunto de relações contraditórias e históricas.

A noção de História tem a ver com movimento, transformação e mudança constantes. Se observarmos bem, tudo muda. Os seres humanos, como qualquer ser vivo, nasce, se desenvolve e morre. Também, surgem, crescem e perecem cidades, reinos e civilizações, mas essa permanente mudança do mundo humano faz parte de um movimento muito mais amplo e belo que abarca o conjunto da realidade.

O Universo, de acordo com pesquisas científicas, tem provavelmente 13,7 bilhões de anos. Nosso planeta Terra possui 4,5 bilhões de anos e a vida originou-se há aproximadamente 3,7 bilhões anos. Já nossa espécie (Homo sapiens) emergiu em torno de 200 mil anos, na África, por meio de um processo de evolução biológica (mutações aleatórias e seleção natural). Noutras palavras, tudo o que conhecemos é histórico e mutável. Como disse o antigo filósofo grego Heráclito: “só a mudança permanece”. 

Agora, onde se localiza o processo social chamado de Educação?

Toda comunidade humana, seja na “Idade da Pedra” ou atualmente, precisa se manter e continuar no tempo, ou seja, precisa se reproduzir. Nesse sentido, necessita reproduzir suas relações sociais e instituições, como também, precisa reproduzir indivíduos aptos para viver na forma social historicamente determinada. 

Então, a reprodução social é composta de uma dualidade integrada: reprodução das relações sociais e reprodução dos indivíduos. Nesse movimento, são reproduzidas as classes sociais (nas sociedades classistas), as instituições, as ideias, os costumes, os conhecimentos, a divisão social do trabalho e os indivíduos que exercerão diversas funções sociais para a preservação e desenvolvimento de cada estrutura social específica.

No processo constante da reprodução social, a educação ocupa um lugar especial, exercendo a função de gerar (formar) indivíduos conforme as necessidades, valores e conhecimentos de cada sociedade particular. Tal processo não é simples, principalmente em sociedades centradas no conflito entre classes sociais antagônicas.

Agora, o importante é destacar que a História da Educação trata de mudanças ocorridas  no processo de formação de indivíduos em sociedades concretas. No entanto, a História da Educação não é apenas uma disciplina descritiva, porque busca tornar inteligível as razões e os sentidos do processo educativo nas inúmeras sociedades humanas. Isso possibilita intervenções no presente com o objetivo de orientar  mudanças educacionais que favoreçam a maioria do povo brasileiro e uma estratégia de desenvolvimento nacional.