sábado, 2 de novembro de 2019

Há um sentido na vida?


silhouette photography of person
Foto: Greg Rakozy

A vida não possui um sentido. Melhor, o sentido da vida é viver. Se algum poeta já tiver feito alguma construção desse tipo, perdoem-me, leitores, mas é isso que quero dizer nesse texto desabafo. Como somos seres pensantes, seres de finalidade, queremos encontrar um sentido em todas as coisas. Esquecemos que esse sentido não é anterior, mas é construindo na nossa ação de viver. Nossa vida é o sentido de nossa vida. Não há nada a se encontrar para além daquilo que construímos na nossa jornada. É um grande consolo, porém, pensar que existe outro mundo depois desse – seja ele como for, de acordo com cada crença transcendente.
Estou falando disso porque pensei muito sobre a morte nesses últimos dias. Pensei nela do lado de cá, de quem fica na saudade, mas foi inevitável pensar na minha própria morte e no sentido da minha própria vida. Chico Anysio disse, certa vez, que não tinha medo de morrer, tinha pena de morrer. Concordo demais com essas sábias palavras. A morte significa mesmo o fim; o fim das possibilidades, o fim do sentido da vida. Talvez seja esse o sentimento que temos, mas que não conseguimos colocar em palavras como o brilhante cearense Chico Anysio. Temos medo da morte porque gostaríamos de continuar vivendo, de permanecer convivendo com aqueles que amamos, de seguir errando e acertando na nossa jornada de vida.
Superar a pena da morte não é fácil. Estar diante da possibilidade real de perder alguém que amamos é uma das maneiras mais cruéis de encarar a finitude da vida porque, na verdade, a dor é de quem fica, pois, quem vai não sente mais dor. Se compreendemos que o sentido da vida está na própria vida, poderemos viver mais plenamente e tentar esgotar as máximas possibilidades de nossa existência, assim, encontraremos em cada uma de nossas escolhas, em cada minuto de nossas vidas o sentido de existir que nos é negado.
Nunca dei tanto valor às palavras do barbudo do que quando precisei pensar sobre a morte. O sistema capitalista nos nega o direito à vida e ao sentido dela porque, se não nos vemos seres humanos no nosso cotidiano, nas pequenas coisas do nosso dia-a-dia, nas relações que estabelecemos com os outros, vamos precisar procurar por uma razão de viver que não está no nosso horizonte: um cargo de sucesso, um diploma de doutorado, um casamento milionário, um carro do ano. O sistema capitalista torna nossas vidas um campo de batalha pelo mínimo necessário para viver, assim, transforma a vida numa luta extenuante na qual não vemos sentido porque não nos sentimos felizes.
A possibilidade de poder fazer essa reflexão aqui não é também acessível a todos os seres humanos. Estou nessa posição por uma série de fatos, escolhas, lutas e acasos que me permitiram um nível de consciência para elaborar tais pensamentos. Eu sei que, para a maior parcela da classe trabalhadora, não é possível encontrar o tão desejado sentido da vida, por isso somos presas tão fáceis de todos os tipos de alienação religiosa que nos convence de que não somos donos do nosso próprio destino. 
A tarefa revolucionária tem um papel fundamental nisso, na possibilidade de que possamos encontrar sentido nas pequenas coisas de nossa vida, no fato de sermos seres humanos, no fato de existirmos e de construirmos o sentido de nossa própria existência.

Karla Raphaella Costa Pereira
Doutoranda em Educação no Programa de Pós-Graduação em Educação da Universidade Estadual do Ceará - UECE.