domingo, 26 de julho de 2020

O conto da Aia, uma resenha


O livro O Conto da Aia, da escritora canadense Margaret Atwood, trata-se de um romance distópico que narra a vida na República de Gilead, anteriormente o território dos EUA. Publicado em 1985, a narrativa se passa num futuro próximo, num país governado por um regime teocrático e totalitário, imposto por cristãos radicais sob uma interpretação extremamente exagerada e desvirtuada do Velho Testamento.

A história é narrada pela perspectiva de Offred, uma aia cuja única função é dar um filho ao Comandante. Retirados todos os seus direitos, até mesmo a sua identidade, em Gilead, as mulheres são divididas em castas funcionais: as Marthas, para serviços domésticos; as Esposas, administradoras do lar; as Aias, como reprodutoras; e as Tias, senhoras que educam as mulheres para a servidão e submissão.  

Pelo viés da opressão às mulheres, o leitor é levado a observar cada parte da estrutura que organiza a sociedade que, sob a alegação de princípios religiosos, supostamente éticos e justos, mantém as cisões e as ordenações essenciais para a manutenção de um sistema não apenas opressor, desumanizador, mas principalmente, destrutor de vidas. Nesse Estado, as universidades foram extintas, não existem jornais, livros, revistas ou filmes. Não existem também advogados, uma vez que ninguém tem direito à defesa. Os “criminosos” são fuzilados e expostos em praça pública para servir de exemplo.  

Compondo um panorama completo de um Estado teocrático e totalitário e seus aspectos políticos e sociais, com evidente inspiração em estados fundamentalistas, o romance desenvolve-se com maestria ao equilibrar de forma harmoniosa elementos do gênero literário distopia e a realidade, criando um ambiente no qual o leitor é conduzido a fazer profundas reflexões, guiado pela carga simbólica dos personagens, cenários e acontecimentos.

Entre muitos momentos tensos, cenas fortes e profundamente simbólicas da obra, a narradora e personagem principal, a aia Offred se pergunta, em alguns momentos, como as pessoas permitiram que aquilo acontecesse, lembrando que alguns se rebelaram, lutaram, porém sem êxito. Outros, simplesmente ignoraram os sinais e indícios que se apresentavam de forma iminente dessa possível ditadura. Mergulhada em um sofrimento sem medidas, deixa em aberto esses questionamentos.  

Inquestionavelmente atual, o Conto da Aia é uma leitura imprescindível para quem deseja compreender a conjuntura política vivenciada mundialmente nesse momento.


Profa. M.a Marcilia NogueiraProfessora da Rede Estadual de Ensino do Ceará, membro do GPOSSHE.

Foto: acervo pessoal de Karla Costa cedido ao GPOSSHE.